Em um momento em que o Brasil enfrenta a redução da superfície hídrica pelo segundo ano consecutivo, o município de Venâncio Aires registra uma trajetória inversa. Dados do sistema MapBiomas, divulgados neste mês, mostram que a área coberta por água no município atingiu 476 hectares em 2024, o maior valor registrado desde o ano 2000.
A série histórica revela variações anuais, mas aponta uma tendência de estabilidade relativa nas últimas décadas, com destaque para o crescimento recente. Em comparação com os 418 hectares registrados em 2023, o aumento foi de aproximadamente 13,8%. Ainda mais significativo é o salto em relação a 2021, quando a superfície hídrica estava em apenas 358 hectares.
Segundo o MapBiomas, a superfície de água em Venâncio Aires está dividida entre áreas naturais, como rios, arroios e nascentes, e reservatórios artificiais, como açudes e represas. Em 2024, os dados mostram que 270 hectares correspondem a corpos d’água naturais, enquanto 206 hectares são de reservatórios — ambos os maiores valores registrados nos últimos anos. Esse aumento reforça o papel estratégico da região na gestão de recursos hídricos, tanto para abastecimento humano quanto para atividades agrícolas.
CHUVAS INTENSAS
O relatório associa o aumento da superfície d’água no município às chuvas intensas que atingiram o estado do Rio Grande do Sul entre abril e maio de 2024. O evento climático extremo afetou centenas de municípios gaúchos, com enchentes que causaram danos materiais, perdas humanas e impactos ambientais.
Apesar dos transtornos, o volume excepcional de precipitação contribuiu para a recarga de rios e reservatórios, elevando os níveis de água em diversas regiões. No caso de Venâncio Aires, esse fenômeno pode ter influenciado diretamente o acréscimo de área alagada monitorado em 2024.
O município, é cortado por diversos cursos d’água, como o Arroio Castelhano e o rio Taquari, além de contar com dezenas de açudes em propriedades rurais. Essa configuração favorece tanto o acúmulo natural quanto o represamento da água, especialmente em anos de maior volume de chuvas.
CONTRASTE
Enquanto Venâncio Aires amplia sua superfície hídrica, o cenário nacional é de retração. Em 2024, a área coberta por água no Brasil totalizou 17,9 milhões de hectares, representando uma queda de 2,2% em relação a 2023, quando havia 18,3 milhões de hectares. Os números também são 3,2% inferiores à média histórica da série iniciada em 1985.
Essa perda corresponde a cerca de 900 mil hectares nos últimos dois anos — quase o dobro da área do Distrito Federal. A diminuição da lâmina d’água é atribuída a uma combinação de fatores como mudanças climáticas, gestão ineficiente dos recursos hídricos, avanço do desmatamento e maior demanda por irrigação agrícola.
Mesmo o bioma Pampa, que abrange parte do território gaúcho, apresentou um leve recuo de 0,03% em relação à sua média histórica. Porém, municípios como Venâncio Aires se destacam por mostrar crescimento pontual e sustentado na superfície d’água, revelando como as dinâmicas locais podem contrastar com a tendência nacional.
CONSERVAÇÃO
O monitoramento feito pelo MapBiomas é fundamental para entender as transformações no uso e cobertura do solo no Brasil. A plataforma, formada por uma rede de universidades, ONGs e empresas, analisa imagens de satélite e aplica tecnologia de inteligência artificial para mapear as mudanças ambientais no território nacional ano a ano.
Além da superfície hídrica, o sistema também acompanha áreas de vegetação nativa, agricultura, pastagens, áreas urbanas e mineração. Os dados são utilizados por gestores públicos, pesquisadores, organizações ambientais e sociedade civil como base para políticas públicas e estratégias de conservação.
No contexto de Venâncio Aires, o aumento da superfície d’água pode representar uma oportunidade para investimentos em proteção de nascentes, recuperação de matas ciliares, melhoria da gestão hídrica e fortalecimento da agricultura familiar, que depende diretamente da disponibilidade de água.