Ao contrário do que o parecer técnico da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sugere, a ex-superintendente de toxicologia da instituição, Sílvia Cazenave, defende a regulamentação dos novos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) como forma de proteger a população. Em entrevista ao Olá Jornal, a doutora em toxicologia e especialista em drogas de abuso pela Organização das Nações Unidas (ONU), esclareceu como esses produtos podem contribuir para redução de danos. A brasileira é perita criminal toxicologista do Instituto de Criminalística de Campinas há 31 anos.
Olá – Como avalia a opção da Anvisa de sugerir a manutenção da proibição dos DEFs no Brasil?
Sílvia – Eu acho que foi confortável a Anvisa manter o mesmo posicionamento de proibir o comércio e o uso de dispositivos eletrônicos. Embora eles tenham feito um relatório extensíssimo e estejam já a algum tempo fazendo uma série de consultas, consulta pública, audiências públicas, discutindo o tema internamente, cria uma certa insegurança não tomar um passo à frente que seria, por exemplo, de fazer uma regulamentação adequada para esse tipo de produto.
Entre os argumentos está proteger a população dos riscos associados ao uso dos DEFs, no entanto, os produtos já são comercializados ilegalmente. Como a regulação poderia auxiliar nesse problema?
Primeiro existe sim um risco, não são produtos isentos de risco. Não se pretende que as pessoas imaginem isso, obviamente. Então eu acho importante destacar que realmente esses riscos existem. É muito mais uma questão de percepção de como resolver a questão do risco, como resolver a questão da exposição. No meu ponto de vista, quando você regulamenta, você está protegendo mais porque você pode informar, terá equipe de fiscalização, tem todas as medidas legais para proteger a população, então nesse caso a regulamentação auxilia muito mais do que a proibição. Na proibição você finge que não está vendo o problema, você criminaliza de alguma maneira o usuário ou quem está fazendo a venda desse produto, uma vez que não é permitido, e você não traz benefício nenhum porque você está vendo que realmente as pessoas estão usando. Se compra em muitos lugares existe a disponibilidade para a compra, então a proibição em si não resolveu o problema. A gente considera que a regulamentação, a fiscalização, a orientação e a informação sim é que vão resolver, tanto que resolveu para o tabaco. Então, se todas as medidas tomadas para o tabaco fossem tomadas também para os dispositivos eletrônicos, talvez a gente tivesse uma queda do número de consumidores. Um pouco isso aconteceu na época do narguilé quando houve uma informação bem maciça a respeito do uso inadequado, apesar de não ser proibido não era permitido que os bares tivessem as pessoas ali fumando, então eu acho que regulamentar é o caminho correto.
Atualmente, se discute todos os produtos eletrônicos em uma mesma regulação. Você entende ser importante regular separadamente conforme o produto?
Essa questão é muito importante, porque existem muitos dispositivos diferentes e eles têm que ser regulamentados de acordo com o risco, de acordo com as medidas de proteção que se busque e elas são diferentes. Tem produtos que não têm nicotina que têm aromatizantes, produtos que têm nicotina em diversas concentrações, produtos que não são de vapor mas de cigarro aquecido, tudo isso não pode entrar num mesmo padrão de regulamentação. É importante que cada produto tenha um rigor maior ou menor, a fiscalização para todos obviamente, para cada produto tem que ter especificidade na regulamentação para não colocar todos como se fossem produtos iguais.